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Foto do escritorHerpeto Capixaba

ENTRE ESPINHOS E FRUTOS: AS INTERAÇÕES ENTRE LAGARTOS E CACTÁCEAS

Redação: Thais Santos Nascimento

Revisor: Erika Santana




Você sabia que, além de serem caçadores ágeis, alguns lagartos também se alimentam de plantas? Diferentes espécies de lagartos já foram registradas se alimentando de flores e frutos de cactáceas. Um exemplo é o Tropidurus hispidus (Figura 1), visto consumindo os frutos do facheiro, Pilosocereus pachycladus subsp. pernambucoensis (Neto, Gomes e Quirino, 2021), e o Tropidurus torquatus (Figura 2), registrado comendo os frutos da cactácea Coleocephalocereus fluminensis, uma espécie endêmica do sudeste brasileiro (Koski, Valadares e Barreto-Lima, 2018).



Figura 1: Tropidurus hispidus, se alimentando ativamente do fruto de facheiro (Pilosocereus pachycladus subsp. pernambucoensis) localizados na Caatinga paraibana. Fonte: Neto, Gomes e Quirino, 2021. Editado por Thais Santos Nascimento. O consumo de plantas por lagartos é um tema pouco explorado na literatura científica, muitas vezes interpretado como uma ingestão acidental. Mesmo lagartos alimentam-se de plantas ou frutos, tal comportamento é frequentemente  considerado de pouca ou nenhuma relevância na dieta desses animais. No entanto, surge uma pergunta: por que alguns lagartos se alimentam ativamente de partes de plantas?



Em ambientes semiáridos, onde os recursos hídricos são escassos, o consumo de plantas pode ser essencial para satisfazer as necessidades nutricionais dos lagartos. A ingestão de sementes e frutos carnosos, como os produzidos por cactáceas, fornece importantes fontes de água, carboidratos e outros nutrientes. Um lagartinho que sabe aproveitar isso é o Lygodactylus klugei (Figura 2), conhecido como bribinha-da-caatinga, que foi flagrado alimentando-se dos frutos do Cereus jamacaru subsp. jamacaru, o famoso e ameaçado mandacaru (Lima da Silva et al., 2021).



Figura 2: A esquerda, um indivíduo de Tropidurus torquatus com um frutinho de Coleocephalocereus fluminensis na boca; a direita, um indivíduo de Lygodactylus klugei se alimentando das sementes e do fruto de mandacaru (Cereus jamacaru subsp. jamacaru). Fonte: T. torquatus: Koski, Valadares e Barreto-Lima, 2018 e L. klugei: Lima da Silva et al., 2021. Editado por Thais Santos Nascimento.


A interação entre o Lygodactylus klugei e o mandacaru destaca a importância dos lagartos na ecologia das cactáceas ameaçadas de extinção. Isso porque, além de se beneficiarem das frutas, os lagartos podem desempenhar o papel de dispersores das sementes dessas cactáceas, levando-as a novas áreas, aumentando as chances de germinação e perpetuação das espécies vegetais.


Outras espécies de lagartos também já foram registradas em interações semelhantes com plantas (Figura 3). O Tropidurus semitaeniatus, por exemplo, foi visto se alimentando dos frutos de Melocactus lanssensianus, enquanto o Tropidurus hygomi foi visto consumindo os frutos de Melocactus violaceus subsp. margaritaceus, ambos cactos conhecidos como coroa-de-frade e que estão ameaçados de extinção (Gomes et al., 2021; Lima da Silva, 2022). A relação entre o T. hygomi e o M. violaceus subsp. margaritaceus é particularmente importante e delicada, já que ambos estão ameaçados. Se as populações de T.hygomi reduzirem cada vez mais, o M. violaceus subsp. margaritaceus pode perder uma importante fonte de dispersão de suas sementes. Da mesma forma, se o cacto desaparecer, o lagarto pode perder uma fonte de alimento e refúgio que o ajuda na sua sobrevivência.


Figura 3: A esquerda, um indivíduo de Tropidurus semitaeniatus se alimentando de Melocactus lanssensianus;a direita, um indivíduo de Tropidurus hygomi se alimentando de frutinhos de Melocactus violaceus subsp. margaritaceus. Fonte: T. semitaeniatus: Gomes et al., 2021 e T. hygomi: Lima da Silva, 2022. Editado por Thais Santos Nascimento.

As interações ecológicas em que lagartos consomem frutos (e podem dispersar sementes) de plantas de regiões áridas ressaltam as adaptações comportamentais dos lagartos e a importância das plantas nos ambientes áridos. A relação entre lagartos e cactáceas é fundamental para a manutenção da vegetação local, especialmente em face da degradação dos habitats naturais. Logo, a proteção dessas espécies e de seus  habitats vai além da preservação de indivíduos, mas também da continuidade das interações ecológicas que sustentam as espécies no ambiente.  


Referências

GOMES, V.G.N.; KOROIVA, R.; CASSIMIRO, C.A.L.; BATISTA, F.R.C. Endangered globose cactus Melocactus lanssensianus P. J. Braun depends on lizards for effective seed dispersal in the Brazilian Caatinga. Plant Ecol., vol. 222, n. 1, p. 1375-1387, 2021.


KOSKI, D.A.; VALADARES, R.T.; BARRETO-LIMA, A.F. Fruits in the lizard’s menu: consumption of Coleocephalocereus fluminensis (Cactaceae) by Tropidurus torquatus (Tropiduridae). Herpetology Notes, vol. 11, n. 1, p. 853-855, 2018. 


LIMA DA SILVA, T. Tropidurus hygomi e Melocactus violaceus subsp. margaritaceus: saurocoria envolvendo duas espécies ameaçadas de extinção da Restinga. Dissertação (Mestrado em Ciências Naturais) - Programa de Pós-Graduação em Ciências Naturais da Universidade Federal de Sergipe, Itabaiana, Sergipe, 2022. 


LIMA DA SILVA, T.; ANDRADE, H.; DANTAS, W.M.; DIAS, E.J.R. Lygodactylus klugei (Smith et al., 1977) as a fruit eater on the cactus Cereus jamacaru DC. subsp. jamacaru in the Caatinga of northeastern Brazil (Squamata: Gekkonidae). Herpetology Notes, vol. 14, n. 1, p. 67-71, 2021. 


NETO, I.N.S.; GOMES, V.G.N.; QUIRINO, Z.G.M. Frugivory by Tropidurus hispidus 

(Squamata: Tropiduridae) on the cactus Pilosocereus pachycladus in the Brazilian Caatinga. Phyllomedusa, vol. 20, n. 1, p. 105-108, 2021. 


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